sábado, 11 de julho de 2015

Quando você descobre que só fala de si mesmo

Este post vai conter uma ironia muito grande decorrente da sua própria existência, ponto positivo pra quem pegar antes de eu revelar qual é no final.

A felicidade da criança recebendo um ponto positivo. E, para quem não viu Inside Out ainda,
vá ver, que é muito, muito bom.

Nestes últimos tempos, estive me dedicando bastante ao meu blog sobre games. Me esforcei bastante e por dez semanas consegui manter ele com pelo menos uma atualização por semana. Esta vai ser a primeira que não vou conseguir postar. Quero dizer, esta semana em que comecei a escrever este texto, pode acabar acontecendo de eu demorar mais de uma semana escrevendo-o (acontece bastante, tenho vários textos começados e parados há mais de mês) (o post do arroz dourado, por exemplo, levei uns dois meses pra terminar) (a partir do momento que parte da idéia dos meus blogs é eles serem um porta-fólio, admitir que eu demoro escrevendo deve ser a pior das idéias) (o mais correto em português é porta-fólio, estou pasmo também). Sem contar que pode acontecer de eu conseguir escrever alguma coisa rápida antes de sábado e assim manter a minha promessa de um post por semana lá, mas não garanto nada.

De qualquer maneira, estou escrevendo aqui para falar sobre o que me bloqueou completamente para escrever no blog sobre games, e que me afundou numa das minhas crises depressivas que fazia tempo que eu não tinha. O fato do meu remédio ter acabado e eu ter ficado um dia sem ele influenciou, assim como uma explosão de raiva grande que eu tive com a minha família (e que me inspirou para escrever este post no blog sobre games), mas o principal fator nessa minha última crise foi a constatação de que tudo que eu escrevo é sobre a mesma coisa: eu mesmo.

Prova fotográfica da minha explosão de raiva. E, sério, vá ver Inside Out. É realmente muito bom.

Eu. Eu eu eu eu eu. Eu.


Quando comecei o blog sobre games, um dos meus objetivos era fazer com que eu escrevesse mais, já que eu demoro para achar assuntos para falar aqui e os meus outros projetos são mais de longo prazo. A solução encontrada foi escrever sobre videogames, que é uma coisa que eu gosto muito e acompanho avidamente. Outro objetivo era que eu escrevesse de uma maneira diferente daqui, que eu tentasse ser mais “““““““jornalístico”””””””, mas que ainda assim eu emitisse uma opinião.

Pode parecer meio contraditório querer ser mais jornalístico, uma modalidade de escrita que preza muito a imparcialidade, e ao mesmo tempo querer emitir uma opinião, mas isso é fruto de uma crença que eu tenho sobre a humanidade: nossa visão nunca é neutra de verdade, pois nossas vidas moldaram nossa percepção do mundo e sempre vamos emitir um julgamento sobre tudo o que vemos e vivemos, logo a imparcialidade do jornalismo não existe, pois os jornalistas são humanos. Quando tivermos robôs jornalistas, aí é outra história. E sim, deve ter um monte de pensadores e acadêmicos infinitamente mais inteligentes que eu que já falaram disso e já pensaram sobre isso, mas a questão aqui não é a busca fútil por imparcialidade por parte do jornalismo, mas como esses dois objetivos influenciaram e guiaram os textos no meu blog sobre games, onde eu emitia a minha opinião mas tentava ter um certo ar mais impessoal.

Pelo menos no começo.

Que rapidamente eu comecei a encher o blog de “Hora da historinha”, o subtítulo que eu inventei para introduzir algum relato da minha vida pessoal. Ou seja, ao invés de um blog sobre games, tudo o que eu criei foi um blog sobre a minha pessoa e minhas experiências com games, não muito diferente deste aqui. Só que com mais games.

Eu só fui perceber isto depois de ter postado o texto “Sobre videogames e conflitos de gerações”, onde o tema em questão realmente é algo muito pessoal para mim, e o post ficou focado quase 100% na minha pessoa e na minha vida. A ficha caiu enquanto eu relia pela sétima vez o texto depois de postado (hábito que eu tenho, ficar relendo o que escrevo depois de ter postado procurando erros de português e de lógica).

Tudo bem se eu só escrevesse esses tipos de posts de vez em nunca, aqui e ali, e concentrasse o blog em algo interessante de verdade, como videogames. Mas eu fui relendo alguns dos posts anteriores e fui percebendo que praticamente todos tinham uma dose de “aqui está minha vida, aqui estou eu, olhem pra mim, me aceitem, eu, eu, eu, eu.”

Sabe quando o viés de confirmação depressivo fica preso no onze e tudo o que você vê é aquilo que confirma que você é um bosta? Foi isso que aconteceu. E isso me deixou péssimo.

A tristeza assumiu os controles por dias. Mas, como aprendi vendo Inside Out,
ficar triste faz parte da vida. Vá ver e aprender isso também.

Tudo o que eu percebia era que meus textos eram uma pilha de lixo ególatra focada no meu umbigo e que eu era um metido egocêntrico que não acrescenta nada à raça humana e que ficava choramingando para o mundo por aceitação e atenção.

Daí, eu travei. Não conseguia escrever mais nada. Comecei uns dois textos diferentes pro blog sobre games e tentei continuar um conto que estou escrevendo para um concurso, mas não saía nada. Eu começava a escrever e tudo o que eu lia era eu falando sobre mim mesmo.

Como é que o Woody Allen consegue? Que, para mim, não parecia que ia dar. Cheguei bem perto de deletar os dois blogs e desencanar de escrever para sempre.

Mas passou.

Ou melhor, acalmou. Depois de um pico depressivo e alguns dias chafurdando na caixa de areia dos gatos, voltei a me sentir melhor. Pelo menos um pouco. Quinho. Acho que ter retomado o remédio ajudou.

Nessa, decidi reler tudo o que eu escrevi no blog sobre games e alguns dos textos neste blog para ver se eu realmente era tão egomaníaco quanto eu estava achando.

A conclusão que eu cheguei: mais ou menos.

A parte de eu me achar o centro do universo e só falar de mim mesmo a minha depressão exagerou, não sou tanto assim. Só uns 38% do tempo, eu diria. Mas a parte de eu ser um inseguro desesperado por aceitação? Essa parte é verdade, e é o que me faz falar tanto sobre mim.

Eu eu eu eu eu sou assim, me aceitem, pensem que nem eu


O que foi que eu percebi nessa minha releitura toda?

Que toda vez que eu opinava sobre alguma coisa, eu começava a explicá-la e justificá-la, e o modo que eu sempre escolhia para fazer isso era expondo um episódio na minha vida pessoal que contribuiu para eu pensar desse jeito.

O que faz todo o sentido do mundo, afinal de contas é assim que formamos nossas opiniões, um evento ou uma seqüência de eventos moldando nossa visão de mundo. Muitas vezes leva algum tempo até a gente entender o que aconteceu e como isso nos afetou, mas a questão é: nossas experiências constróem nossas opiniões. Espero que todo mundo concorde com isso.

Mas isso acabava por rechear o blog sobre games com “eu” ao invés de games. O foco passou de eu opinar e comentar games a eu ficar me explicando e justificando desesperadamente a minha opinião do que necessariamente acrescentar algo ao hobby.

Com isso, eu não apenas conseguia (ou pelo menos tentava) que vocês, leitores, entendessem a minha opinião como também a aceitassem, ou pelo menos aceitassem que eu a tenho. Ou seja, era uma maneira de evitar uma discussão.

Que discussões e conflitos são alguns dos meus maiores medos. Outro medo meu são aquelas mariposas gigantes,
fico apavorado. E eu sei que vocês já entenderam que é pra ver Inside Out, mas como temo que a mensagem
ainda não chegou a todos, aqui estou falando de novo: vá ver Inside Out.

A partir do momento que eu foco o texto na minha experiência ao invés da minha opinião, fica (um pouco) mais difícil de comprar uma briga. Por exemplo: uma coisa é eu falar que Fire Emblem é a melhor série de games de todos os tempos, outra coisa é eu falar que Fire Emblem é a minha série de games favorita de todos os tempos e outra coisa é eu falar que Fire Emblem é a minha série de games favorita de todos os tempos porque nela eu sinto que consigo superar a minha auto-imagem de alguém que nunca teve nada a acrescentar à vida de ninguém e que, desde criança, sempre enxergou as poucas vitórias na vida como um “não fez mais que a obrigação”, pois no universo de Fire Emblem eu sou uma presença importante na vida desses personagens, fazendo alguma diferença na felicidade deles (criando casais e BFFs) e conduzindo-os a uma vitória significativa (salvando o mundo).

Dá pra pegar a diferença? É mais fácil discutir comigo nas duas primeiras observações, basta falar que “Fire Emblem não é a melhor série de games de todos os tempos, é Angry Birds porque vendeu mais e é mais reconhecido” ou “Fire Emblem só é a sua série favorita porque você nunca jogou Need for Speed”, ou seja, o meu interlocutor imaginário só precisa determinar parâmetros de comparação diferentes que assim ele consegue desmerecer a minha opinião.

No terceiro caso, porém, a discussão iria pra onde? Questionar a minha experiência de vida? Falar que “você nunca se viu como alguém que nunca teve nada a acrescentar à vida de ninguém”? Falar que Fire Emblem não me faz sentir melhor em relação à minha auto-imagem? Não tem como o meu interlocutor imaginário discutir isso, pois ele não sou eu e não tem como ele ter autoridade sobre os meus sentimentos e a minha percepção. Ele pode questionar se o que eu sentia estava de acordo com o que realmente estava acontecendo, mas ainda assim não dá pra negar o que eu sentia. Aliás, essa é outra parte do “truque” aqui: sempre ressaltar que tudo não passa do meu ponto de vista e dos meus sentimentos, e não de uma realidade objetiva e quantificável, criando uma situação onde “gosto não se discute”, ou pelo menos “o gosto do Vitor não se discute”.

O que eu faço nada mais é do que mudar o foco da discussão da qualidade de Fire Emblem para “foi assim que cheguei à minha opinião”, e não tem como elaborar uma discussão séria e/ou interessante no segundo caso. É assim que eu estou sempre certo: a partir do momento que eu só estou falando do que eu penso e sinto, não tem como eu estar errado, pois só eu sou eu.

A única coisa que eu posso falar a favor dos meus posts é que pelo menos eles nunca caíram muito descaradamente num “olhem pra mim, coitadinho de mim, me amem”. Mas que bateu na trave algumas vezes, bateu.

Conclusão


Nós, seres humanos queremos ser aceitos. E eu, numa tentativa desesperada de ser aceito, criei textos que são pedantes no excesso de auto-explicação no melhor dos casos ou são egocêntricos e auto-centrados no pior.

Não era isso o que eu queria. Pelo menos não no blog sobre games, que aqui vai continuar focado na minha pessoa, já que aqui é o meu blog pessoal.

Meu objetivo no blog sobre games era emitir opiniões e comentários para fazer os leitores refletirem sobre o assunto. Daqui pra frente, é o que eu vou tentar fazer, me explicando menos e deixando o diálogo fluir mais.

Se eu vou conseguir, isso são outros quinhentos.

Ah, e a ironia inerente deste post, para quem não pegou: é que este é um texto onde eu falo de mim mesmo e me explico incessantemente tentando justificar a minha percepção de que eu só escrevo sobre mim mesmo e só fico me explicando incessantemente tentando justificar minhas opiniões. Não sei se isso se classifica como uma ironia de verdade ou como uma ironia Alanis Morrissete, mas me pareceu irônico. Que nem uma mosca preta num Chardonnay.

Não sei se isso realmente é irônico, Alanis, mas é nojento.
Quanto ao resto da humanidade, vá ver Inside Out.